Para se fazerem entender
pelos jesuítas, pelos demais índios da aldeia e pelos colonos, os índios cristãos
viam-se obrigados a aprender essa nova língua, que passou a servir também para a
aprendizagem do idioma português.
Inicialmente os aldeamentos governados pelos missionários jesuítas
serviram também aos interesses dos colonos, do governo-geral brasileiro e
da Coroa portuguesa. A partir 1757, entretanto, o trabalho dos jesuítas deixa de contar
com o apoio da Coroa Portuguesa, então interessada em aumentar a produção agrícola da
colônia, para o qual, como reivindicavam os colonos, a escravização dos índios
era necessária.
Os jesuítas foram expulsos do Brasil e os aldeamentos elevados à
categoria de vilas, sendo criado o regime de Diretório, representado por um diretor nomeado
pelo governador.
A implantação do Diretório de Índios não representou mudanças
significativas para as populações indígenas, pois, em linhas gerais, deu
continuidade ao regime anterior de expropriação. Ressalte-se, porém, a proibição pelos Diretórios
do uso de línguas indígenas em salas de aulas, inclusive da Língua Geral, e a definição da obrigatoriedade do ensino da língua portuguesa e de seu uso.
Com a implantação dos Diretórios intensificou-se a escravização
dos índios para atender ao aumento da necessidade de braços para atuarem nas
atividades domésticas, agrícolas e extrativistas. Os indígenas foram considerados
próprios para essas funções, tanto pelo fato de estarem adaptados às condições naturais da
região, quanto por serem mais baratos do que os escravos negros que já vinham sendo
comercializados no Brasil desde 1580.
Em 1798 foi também revogado o Diretório dos Índios e nada o
substituiu oficialmente até 1845, quando o Decreto 426, de 24 de julho, definiu o
Regulamento das Missões. Essa norma trata das diretrizes gerais para a
reintrodução de missionários no Brasil que voltassem a se responsabilizar pela catequese e
civilização dos indígenas.
A atuação desses missionários assemelhou-se, em alguns pontos, ao
trabalho anteriormente desenvolvido pelos missionários jesuítas. Por
exemplo, retoma-se o sistema de aldeamento, que volta a ser entendido como ferramenta
imprescindível para os processos de catequização, civilização e assimilação física e
social dos índios ao restante da população.
Porém, pelo menos duas diferenças merecem destaque. Em primeiro
lugar, não foi dada a esses missionários a mesma autonomia desfrutada pelos
jesuítas. Eles ficaram inteiramente a serviço do governo brasileiro, sem contestar suas
determinações e, em alguns casos, nem mesmo eram responsáveis pelo governo dos
aldeamentos, pois seus contratos tratavam de prestação de serviços à
administração provincial como assistentes religiosos e educacionais. Em segundo lugar, esses
missionários acreditavam que o convívio com cristãos facilitaria a catequização dos índios,
razão pela qual, diferentemente dos jesuítas, eles permitiam a permanência de não-índios nos
aldeamentos (militares, comerciantes, colonos, escravos e ex-escravos negros)4.
Ao instalar os missionários nos diversos aldeamentos, o Estado
monárquico subvencionava a criação e a manutenção de escolas para as crianças e adultos
indígenas que se interessassem em aprender a ler, escrever e contar
(instrução primária). Essa política desenvolvia-se a partir da visão da escola como instrumento de
desenvolvimento humano capaz de viabilizar a formação do povo brasileiro. Com
relação às populações indígenas, esse desenvolvimento só seria alcançado se elas fossem
catequizadas e integradas ao mundo do trabalho das sociedades não-índias.
Assim, nesse período, incluía-se também como função da educação
para os índios a formação voltada para certos ofícios. O Regulamento da Catequese
e Civilização dos Índios, de 1845, propunha a criação de oficinas de artes
mecânicas e o estímulo à agricultura nos aldeamentos indígenas, bem como o treinamento
militar e o alistamento dos índios em companhias especiais, como as de navegação.
Por volta de 1870, diante da difi culdade de manter os índios nas
escolas dos aldeamentos, ocorre em algumas províncias o investimento em
institutos de educação, em internatos e, no caso específico de Pernambuco, em orfanatos
para crianças indígenas, com o fim de transformá-las em intérpretes lingüísticos e
culturais para auxiliar os missionários na suposta civilização dos seus parentes. Essas
escolas localizavam-se fora da área dos aldeamentos e pretendiam oferecer às crianças
indígenas não só a instrução primária elementar, mas também ensino para desempenho de
funções identificadas com o desenvolvimento das províncias e com os processos
de assimilação da diversidade dos povos indígenas.
Em linhas gerais, durante todo o Período Imperial (1808-1889)
realizaram-se muitos debates em torno do tema educação escolar primária
organizada e mantida pelo poder público estatal que pudesse atender, principalmente,
negros (livres, libertos ou escravos), índios e mulheres, que compunham as chamadas camadas
inferiores da sociedade. Isso se deu em um contexto onde a instrução popular era
considerada a base do progresso moral, intelectual e social de qualquer país e
havia o entendimento, tanto no plano nacional quanto no internacional, de que investir
na quantidade de escolas e de alunos representava a preocupação para com o
progresso e civilização de uma nação.
No entanto, estar presente nas agendas políticas da época não
representou para os índios uma política imperial voltada especifi camente para seus
interesses. Ao final do Império, os especialistas e autoridades, que chegaram a se
entusiasmar com a possibilidade de haver instituições públicas destinadas ao ensino de crianças
indígenas, desacreditavam que isso pudesse ocorrer sem a intervenção das missões religiosas.
Dessa
forma, até o início do século XX o indigenismo brasileiro viverá
uma fase de total identificação com a missão católica e o Estado dividirá com as ordens
religiosas católicas, mais uma vez, a responsabilidade pela educação formal para índios.
Assim, na primeira década do período republicano, é retomada a
oferta às populações indígenas de ensino suplementar associado ao ensino de ofícios,
voltados às necessidades locais, sob o comando das missões religiosas que
fundaram alguns internatos para a educação de meninos e meninas5.
Nos anos seguintes, com a instauração e consolidação do regime
republicano, o Estado sistematizará uma política indigenista com a clara intenção
de mudar a imagem do Brasil perante a sociedade nacional e mundial. Órgãos
governamentais são criados com as funções de prestar assistência aos índios e protegê-los
contra atos de exploração e opressão e de gerir as relações entre os povos indígenas, os
não-índios6 e os demais órgãos de governo.
Nesse espírito, cria-se em 1910 o Serviço de Proteção aos Índios
(SPI), que será extinto em 1967, sendo suas atribuições repassadas para a Fundação
Nacional do Índio (Funai).
4 Segundo Amoroso (2001:138): “a presença de não-índios nos aldeamentos do século XIX fez com que, na maioria das vezes, a escola e outras instituições de apoio às populações indígenas aldeadas acabassem atendendo aos não índios, usando para isso a verba destinada à catequese dos índios”.
5 Segundo Rizzini (2004:380) “[…] no Norte, os capuchinhos da
Ordem da Lombardia fundaram, em 1895, um colégio (Instituto Indígena) para jovens índios Tenetehara, Canela
e Timbira, maiores de 14 anos, provenientes de aldeamentos do Maranhão. Dois anos depois, os capuchinhos
instalaram na recém-criada Missão de São José da Providência do Alto Alegre um internato para meninas menores de 14
anos, vindas de diversas aldeias”.
6 Com o crescimento econômico as terras ocupadas pelas populações
indígenas passam a ser alvo de interesse dediferentes grupos e motivo de confl itos entre índios e
latifundiários, posseiros, garimpeiros, empresas de mineração ou as responsáveis pela construção da infra-estrutura (estradas,
hidroelétricas).
Fonte:http://www.secult.salvador.ba.gov.br/site/documentos/espaco-virtual/espaco-diversidade/RELAÇÕES%20ÉTNICAS/WEBDOCUMENTOS/educacao%20escolar%20indigena....pdf
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