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segunda-feira, 8 de abril de 2013

Marinha oferece casas para remover quilombolas de Aratu

 

Disposta a investir mais de R$ 3 milhões, a União pretende resolver de forma amigável o impasse, deixando de lado as convicções de órgãos federais

 

Alexandro Mota
alexandro.silva@redebahia.com.br

Posseiros: aqueles que se encontram na posse clandestina ou ilegítima de terras particulares. Quilombolas: comunidade descendente de africanos escravizados que mantêm tradições culturais ao longo dos séculos.

Essa poderia ser uma discussão semântica, se não fosse uma briga judicial que vai completar quatro anos entre a Marinha do Brasil e moradores do local que ficou conhecido com quilombo Rio dos Macacos, município de Simões Filho, na Região Metropolitana de Salvador.

Disposta a ceder um terreno de 210 mil m² e investir mais de R$ 3 milhões, a União pretende resolver de forma amigável o impasse, deixando de lado as convicções de órgãos federais: para a Marinha trata-se de posseiros; para o Instituto Nacional de Colonização e Reforma Agrária (Incra), Ministério Público Federal (MPF) e Defensoria Pública da União (MPU), aquela é uma comunidade remanescente de quilombo.

A proposta é: toda a comunidade, que hoje, segundo levantamento da Justiça ocupa uma área de 59 mil m² (o equivalente a 5 campos de futebol) da área total de 3 milhões m² de propriedade da Marinha (277 campos de futebol), seria deslocada para um trecho do terreno que fica a cerca de 500 metros de onde hoje eles moram.

Segundo o documento a que o CORREIO teve acesso, assinado pelo chefe da Assessoria Especial da Secretaria-Geral da Presidência da República, Diogo de Sant’Ana, pela proposta 210 mil m² da área da Marinha passam a ser dos moradores. Cada família receberá um lote de 300 m² e uma casa construída pela própria Marinha, além da inclusão no programa Brasil Quilombola.




Se aceitarem, a Marinha garante que os quilombolas só precisarão desocupar as casas onde moram atualmente após o fim da construção das novas casas, que terão investimento de R$ 3 milhões (valor que não inclui o estudo e a construção das alvenarias). Para resolver uma das principais queixas da população, impedida de fazer plantações onde moram atualmente, 36 mil m² da área seriam reservados para o cultivo.

A Marinha argumenta ainda que o terreno fica às margens da BA-256 e permitirá o acesso a infraestrutura básica: água encanada, energia elétrica regularizada e saneamento, além de livre acesso. Hoje grande parte dos quilombolas usa água do Rio dos Macacos e queixa-se das restrições e atritos sempre que precisam entrar na Vila Naval.

“Não queremos o mal dessas pessoas. Queremos ceder e estamos oferecendo algo bastante vantajoso. O que não achamos aceitável é que a Marinha tenha que sair dali, de um lugar estratégico para a segurança da Nação e que hoje é a segunda base em importância da Marinha”, avalia o comandante do 2º Distrito Naval, vice-almirante Monteiro Dias.

Um laudo emitido pelo Ibama no ano Passado é utilizado pela Marinha para indicar que as moradias, consideradas irregulares, e o plantio e queimadas na região têm colaborado para o assoreamento da barragem dos Macacos, única fonte de distribuição de água para as atividades da Base Naval de Aratu.

O número das famílias beneficiadas pela proposta é outro ponto de divergência: a Marinha acredita que hoje haja cerca de 35 famílias morando no local. No relatório do Incra constam 67. Os três processos que correm na Justiça (veja ao lado) somam 30 réus.

Recusa


Porém, apesar da proposta — apresentada à liderança dos quilombolas no início do ano — a briga parece estar longe do fim. “Quando eles chegaram, nós já estávamos aqui. Aqui nasceram nossos familiares, nós vivemos hoje dessa terra: da quebra de nicuri, fazendo colares, fazendo cestas, colher de pau, vassouras, vendemos manga e jaca. Não vamos sair daqui pra ir para um ‘Minha Casa, Meu desespero. Não queremos ver nossos filhos, que brincam aqui livres, pedindo esmola no sinal”, argumenta Rosemeire dos Santos Silva, 34, uma das representantes da comunidade.

Os moradores do quilombo demonstram descrença em relação à proposta, principalcom relação a irem para uma área quase quatro vezes maior do que a que ocupam hoje. Para o vice-almirante, a representante do grupo, Rosimeire, não repassa as informações para a comunidade, impedindo um acordo — o que é ela nega.

A rejeição da proposta foi unânime nas cerca de 15 famílias que o CORREIO entrevistou. “Não é uma casa pronta que nos convence. Foi aqui que nascemos, foi aqui que minha avó cortou o cordão umbilical de meus pais, de netos”, afirma Ana Lucia Oliveira dos Santos, 34, que mora em uma vila próxima da casa de três irmãos e da casa do pai, José Catarino Araújo, 61, que conta que seus pais foram funcionários dos fazendeiros de cana de açúcar donos das terras antes de las serem doadas à Marinha, em 1957.

Entre eles, a ordem de despejo de novembro de 2010 - quando o juiz emitiu a tutela antecipada, a favor da Marinha - é motivo de brincadeira. “Tão querendo despejar o senhor, pai”, brinca Ana. Ao que Catarino, segurando a bainha do facão na cintura responde: “Daqui eu só saio morto”.

Fazendas foram doadas à Marinha em meados do século passado


A área hoje em disputa, antes de ser doada para uso da Marinha, era composta por três fazendas (Aratu, Meireles e Macacos), que cultivava cana de açucar. As divergências surgem a partir de 1960, quando a Marinha inicia as atividades na área. A Marinha afirma que ao chegar no local não havia moradias e mostra o contrato de doação do terreno de uma das fazendas, que fala da “posse mansa e pacífica” do terreno doado.

Para a Marinha, só após 1980 alguns agricultores chegaram, começaram a usar o local e firmaram morada. Por conta da extensão da área, a Marinha diz ter perdido o controle. “O laudo do Incra, apesar de não ser publicado, informa que é uma comunidade quilombola. O documento fala que, apesar da doação, havia pessoas residentes lá”, contesta o defensor público federal Átila Ribeiro Dias, referindo-se ao Relatório Técnico de Identificação e Delimitação (RTID) preparado pelo Incra em agosto de 2012, mas nunca divulgado.

A Marinha questiona o RTID. “Houve uma elaboração de um projeto utilizando métodos pouco científicos, baseando-se unicamente em relatos orais dos próprios moradores. Assim, está muito fácil ser quilombola hoje em dia”, afirma o comandante do 2º Distrito Naval, vice-almirante Monteiro Dias. Segundo ele, não há no local senso de comunidade, nem história própria — sendo esses alguns dos requisitos de decreto federal de 2003 que regulamenta o que são comunidades remanescentes de quilombo.

O Incra afirma que seguiu as Instruções Normativas na elaboração do projeto e diz ter contado com uma “equipe multidisciplinar formada por peritos agrários, analistas em Reforma e Desenvolvimento Agrário, analistas em Reforma e Desenvolvimento Agrário com especialização em Antropologia, profissionais da área de cadastro e da área cartográfica”, detalha, em nota.

Maria Madalena Messias dos Santos, 57, é filha da moradora mais antiga do quilombo: Mauricia Maria de Jesus, de 113 anos. “Nossa mãe conta que os pais dela eram trabalhadores da fazenda, foram filhos de escravos, e receberam de boca o terreno como indenização. É um absurdo que hoje digam que não somos filhos de escravos”, diz.

A Marinha afirma que nem um terço da população nasceu no local. Narciso Xavier, 58, é um exemplo. Ele conta que seu pai veio de Sergipe e comprou as terras há cerca de 40 anos. Mas Narciso diz que o pai, descendente de escravo, escolheu o local por identidade com a comunidade.  

Fonte: http://www.correio24horas.com.br/noticias/detalhes/detalhes-3/artigo/marinha-oferece-casas-para-remover-quilombolas-de-aratu/

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